AS ALTERAÇÕES TRABALHISTAS PREVISTAS NA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927/2020, EM RAZÃO DA PANDEMIA OCASIONADA PELA CONTAMINAÇÃO DO COVID-19 (CORONAVÍRUS)
Não é a primeira vez que o mundo enfrenta uma
pandemia. Já foram vários os episódios com efeitos catastróficos vivenciados
pela humanidade, como a cólera, a gripe asiática, a gripe espanhola e o tifo,
que mataram milhares de pessoas ao longo dos anos. Entretanto, dessa vez é
possível assegurar que o vírus que assola o mundo inteiro realmente pegou a população
desprevenida.
Talvez porque o mundo de hoje é um tanto quanto diferente
do passado, com a globalização da economia e, principalmente, da informação. E
em decorrência desta última, naturalmente que a população acaba ficando mais
alardeada com o turbilhão de informações que acabam tendo acesso, muita delas,
inclusive, falsas e que servem por contribuir com este estado de pânico que
estamos vivenciando.
A pandemia do novo coronavírus já deixou mais de 18 mil
mortos pelo mundo e o número aumenta significativamente a cada dia.
Como a
contaminação se dá de forma fácil e extremamente rápida, muitos países têm
adotado medidas de isolamento social, com o objetivo de reprimir o número de
infectados e manter o sistema de saúde apto a receber o número de vítimas
diariamente.
Por
conta disso, vários Estados da Federação – dentre eles Santa Catarina, sendo um
dos pioneiros desta medida – têm adotado a quarentena como forma de evitar a
propagação do vírus, decretado a suspensão temporária das de parte das atividades
do comércio e indústrias.
Diante
deste cenário catastrófico, a primeira indagação que vem a mente: e as
empresas, como vão suportar seus compromissos sem que possam faturar? Realmente
o impacto infelizmente será gigantesco, talvez sem que possamos, neste momento,
mensurar o tamanho do estrago que este vírus causará na economia brasileira e
mundial.
Alguns
especialistas afirmam que esta será a pior crise da história vivenciada pelo
capitalismo, até mesmo maior que a Grande Depressão Americana de 1929. Não
tenho dúvida que nosso nível de riqueza voltará há no mínimo duas décadas.
Como
em quaisquer outras crises, se as empresas não faturarem e não obtiverem lucro,
o efeito natural são demissões em massa e falência de empresas, o que, por
conseguinte, pode gerar um caos social incontrolável a curto e a médio prazo.
Diante deste caótico contexto que o Governo Federal, após o
reconhecimento de estado de calamidade pública no Brasil até 31/12/2020,
através do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, editou a Medida
Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, que dispõe sobre a flexibilização de
medidas trabalhistas para enfrentamento da calamidade pública reconhecida.
MEDIDAS TRAZIDAS PELA MEDIDA
PROVISÓRIA 927/2020, SEUS EFEITOS E SUA APLICABILIDADE
Todas as regras presentes na Medida Provisória 927/2020 são
temporárias e só podem ser aplicadas enquanto durar o estado de calamidade
pública no país. Após, deverão obrigatoriamente ser observadas as imposições da
legislação trabalhista vigente.
Importante aqui esclarecer que a própria Medida Provisória,
em seu art. 1º, parágrafo único, já elucida que o estado de calamidade pública,
para fins trabalhistas, constitui hipótese de força maior e por isso
aplica-se o previsto no art. 501 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
Ainda, a MP 927/2020 notadamente flexibiliza as regras que
comandam as relações trabalhistas, prevendo que os acordos individuais firmados
diretamente entre empregador e empregado terão prevalência sobre as convenções
e acordos coletivos e até mesmo sobre a legislação que trata do tema. Porém,
tais acordos individuais deverão obrigatoriamente respeitar os mandamentos da
Constituição Federal.
Vejo que tais acordos individuais poderão ser uma excelente
ferramenta para a manutenção de empregos e, principalmente, para um mínimo de
previsibilidade quanto aos compromissos do empresário, que neste momento está
angustiado com toda esta horrível situação.
Portanto, senhor empresário, utilize muito esta ferramenta!
Outrossim,
a MP 927/2020 trouxe também as medidas que podem ser adotadas pelo empregador
durante este ano, com o objetivo de enfrentar os efeitos econômicos decorrentes
do estado de calamidade pública e preservar o emprego e a renda das famílias.
Todas estão enumeradas no art. 3º da referida MP e são:
Art. 3º Para enfrentamento dos efeitos econômicos
decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da
renda, poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes
medidas:
I - o teletrabalho;
II - a antecipação de
férias individuais;
III - a concessão de férias
coletivas;
IV - o aproveitamento e a antecipação
de feriados;
V - o banco de horas;
VI - a suspensão de
exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
VII - o direcionamento do
trabalhador para qualificação; e
VIII - o diferimento do
recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.
Aqui, alguns pontos merecem destaque. A
própria MP 927/2020 separou em capítulos as regras a respeito das medidas
previstas no art. 3º, de modo a tornar a aplicação clara e objetiva.
Dentre elas, este apanhado focará da
possibilidade de concessão de férias ao empregado, mesmo que não atingido o
período aquisitivo, e o diferimento do recolhimento do FGTS
Segundo artigo 6º, o empregador poderá
conceder antecipadamente férias individuais a seus empregados, avisando-os com
antecedência mínima de 48 horas (CLT é 30 mínimo de 30 dias), por escrito ou
por meio eletrônico, indicando o período a ser gozado pelo empregado, não
podendo ser inferiores a 5 dias.
Um
ponto principal é que mesmo que o período aquisitivo não foi integralmente
atingido, o empregador poderá conceder férias ao empregado. O pagamento
relativo às férias poderá ser feito até o quinto dias útil do mês subsequente
ao início de seu gozo, diferentemente do que está previsto na CLT, que é dois
dias antes de seu início.
Outra
mudança é quanto ao terço de férias, cujo pagamento poderá ser feito até o dia
20 de dezembro. No caso de pedido de conversão de um terço das férias em abono
pecuniário fica a critério exclusivo da concordância da empresa.
Veja-se,
pois, que a flexibilização proposta pelo Governo Federal é pertinente, e visa
um socorro às empresas e aos próprios empregados, que também estão em situação
de insegurança.
Outra
situação que a MP 927 prevê é a possibilidade da empresa, a seu critério,
conceder férias coletivas durante a vigência do estado de calamidade pública,
devendo, para tanto, notificar o conjunto de empregados afetados com
antecedência de, no mínimo, 48 horas, não aplicáveis o limite máximo de
períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na CLT, que é de
no mínimo 10 dias.
Ademais,
para a concessão de férias coletivas, a MP dispensa a comunicação prévia ao
órgão do Ministério do Trabalho local e aos sindicatos representativos da
categoria.
Outro
ponto importante da MP que beneficia o empresário é o diferimento do
recolhimento do FGTS, podendo as competências dos meses de março, abril e maio
de 2020 serem pagas, em até 6 parcelas, a partir de julho de 2020.
Para
tanto, a empresa deve declarar estas informações à Receita Federal até 20 de
junho de 2020.
Talvez
a eficácia da MP 927 não seja, neste momento, a mais satisfatória possível para
o empresário.
Contudo,
diante deste cenário horrendo, mostra-se minimamente como um alento ao setor,
que prevê dias, meses e anos muito turbulentos pela frente.
Luciano
Beltrame
OAB/SC
21.584
Fonte: Luciano Beltrame