21 de Junho de 2017 - 16h40

A Representação Municipal em Juízo

O Município, em juízo, é representado pelo seu Prefeito, regularmente empossado ou pelo Procurador Municipal, advogado integrante do quadro de pessoal, com poderes para receber citações e intimações judiciais, conforme prevê o Código de Processo Civil[i].

A representação municipal em juízo decorre de previsão legal. O Prefeito municipal assume tal condição, eis que guindado ao cargo por força de mandato eletivo, a partir de sua posse, tendo em vista o que prevê a Constituição Federal[ii] e, ainda, a Lei Orgânica de cada Município.

Já o Procurador municipal possui poder de representação, por força de previsão na lei que instituir o cargo público respectivo. O poder de representação deve estar explícito na norma instituidora do cargo, conferindo poderes expressos para receber citações e intimações, para defender o Município ou para acionar em nome do ente local.

Em regra, o procurador municipal efetivo, cujo ingresso no serviço público municipal decorre de concurso público, é reconhecido sem sobressaltos como representante legal do ente municipal. O comissionado, entretanto, não assume nesta mesma condição e, por vezes, não é admitido como representante municipal em juízo.

Com a entrada em vigor do novo CPC, esta celeuma pode ser dirimida, eis que as normas do processo civil devem ser lidas ou interpretadas com base nas normas, princípios e regras gerais da nossa Constituição. Esta leitura é feita com base no art. 1º do CPC, o qual estipula que “o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código”.

A razoabilidade e a proporcionalidade são princípios que estão inseridos implicitamente na Carta Magna, constituindo em valores desta e que se aplicam ao processo civil, obviamente.

Com efeito, o procurador municipal provido em comissão, cuja lei de instituição do cargo estipule claramente o poder de representação municipal, pode exercer plenamente este múnus público.

Ora, a CF estipula a forma de criação dos cargos públicos[iii], a competência para iniciar tais processos legislativos[iv], ressalva que a Administração Pública pode contar servidores providos em comissão para as funções de direção, chefia e assessoramento[v] e, assim, integra o cargo de confiança como parte do quadro de pessoal do Município.

Nesta linha, observa-se que não se está criando uma norma legal paralela ao art. 75, inciso III do CPC, mas efetivamente alargando a sua interpretação, fundando-se essencialmente na razoabilidade constitucional, para garantir mais celeridade e normalidade aos processos em que figura como parte a fazenda pública municipal, pois não são raros os Municípios brasileiros que ainda não dispõem de procuradorias institucionalizadas e se valem de serviços jurídicos coordenados por servidores providos em confiança.

Não se descarta portanto o direito positivado, ou seja aquele criado por decisão do parlamento e sancionado pelo Poder Executivo, mas trata-se de interpretá-lo de acordo com os valores inseridos na Carta Magna, conforme, aliás, autoriza o art. 1º do CPC.

Esta interpretação adota a teoria que Luigi Ferrajoli [vi] denominou de garantista, segundo a qual “O constitucionalismo rígido, como escrevi inúmeras vezes, não é então uma superação, mas sim um reforço do positivismo jurídico, por ele alargado em razão de suas próprias escolhas – os direitos fundamentais estipulados nas normas constitucionais – que devem orientar a produção do direito positivo. Representa, por isso, um completamento tanto do positivismo jurídico como do Estado de Direito: do positivismo jurídico porque positiva não apenas o “ser”, mas também o “dever ser” do direito; e do Estado de Direito porque comporta a submissão, inclusive da atividade legislativa, ao direito e ao controle de constitucionalidade.”[vii]

Com efeito, ressalvadas as peculiaridades específicas de cada espécie de cargo público: efetivo ou comissionado, existindo previsão legal, a representação judicial do Município pode ser exercida por um servidor comissionado, ocupante da função de procurador, porque tal encontra suporte no art. 1º do CPC em combinação com o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, implicitamente distribuídos na Constituição Federal.



[i] Art. 75, III do CPC

[ii] Art. 29, I da CF

[iii] Art. 37, I da CF

[iv] Art. 61, § 1º. II, “a” da CF

[v] Art. 37, II e V da CF

[vi] Luigi Ferrajoli (Florença, 6 de agosto de 1940) é um jurista italiano e um dos principais teóricos do Garantismo, definindo-se a si próprio como um juspositivista crítico.

[vii] FERRAJOLI, Luigi. Constitucionalismo Garantista e Neoconstitucionalismo. Tradução de A. K. Trindade. Academia Brasileira de Direito Constitucional, p. 99-100.

Compartilhar:

Veja também

Todos os direitos reservados. Campo Erê.com. 2024