Dados divulgados na última semana mostram um aumento da chamada Anomalia do Atlântico Sul no campo magnético da Terra
A NOAA, Administração Nacional de Oceanos e
Atmosfera dos Estados Unidos, acaba de liberar o seu mais recente relatório
sobre o estado do campo magnético do planeta Terra, valendo-se de dados do seu
World Magnetic Model 2020 (WMM2020) e de um modelo mais recente a partir de
dados coletados pelos satélites Swarm da Agência Espacial Europeia (ESA) até
setembro de 2021.
De acordo com a NOAA, as mudanças não lineares no
campo magnético da Terra permaneceram pequenas nos últimos dois anos. Desde a
2020, o pólo magnético Norte (respectivamente Sul) moveu-se a uma velocidade
média de 44 km/ano e sem qualquer mudança perceptível na direção.
Tais movimentos levaram a pequenas mudanças na
forma e localização das zonas de blecaute (WMM), onde a precisão da bússola é
menor. A Anomalia do Atlântico Sul, onde a intensidade do campo geomagnético é
menor, continuou a aumentar, em cerca de 50 nT ao nível do mar, e a se mover
para o Oeste com seu centro deslocado por cerca de 50 quilômetros ao nível do
mar em direção à América do Sul.
Ao contrário de Mercúrio, Vênus e Marte, a Terra é
cercada por um imenso campo magnético chamado magnetosfera. Gerada por forças
dinâmicas e poderosas no centro de nosso mundo, a magnetosfera nos protege da
erosão de nossa atmosfera pelo vento solar (partículas carregadas que nosso Sol
lança continuamente), erosão e radiação de partículas de ejeções de massa
coronal (nuvens massivas de energia e plasma solar magnetizado e radiação), e
raios cósmicos do espaço profundo.
A magnetosfera desempenha o papel de guardiã,
repelindo essa energia indesejada que é prejudicial à vida na Terra, mantendo a
maior parte dela a uma distância segura da superfície da Terra em zonas gêmeas
em forma de rosca chamadas de cinturões de Van Allen.
O que mais chama atenção responde pela sigla AMAS
que significa Anomalia Magnética do Atlântico Sul. Trata-se de um fenômeno que
ainda é um mistério para a ciência e que não raro nas redes sociais alguém
questiona se não estaria interferindo no clima do Brasil e da América do Sul,
apesar de não haver evidência alguma até o momento.
A AMAS, que está crescendo e com seu centro mais
perto da América do Sul, é uma espécie de defasagem na proteção magnética da
Terra localizada sobre o Atlântico Sul, mais especificamente nas regiões Sul e
Sudeste do Brasil, em faixa que se estende até a África.
Mas, como este déficit de blindagem bem acima do
Atlântico Sul pode afetar a vida no nosso planeta? Uma consequência que já
compreendemos é na atuação dos satélites que estão na órbita da Terra.
Ao passarem pela região com baixa na retaguarda de
proteção, eles podem apresentar avarias causadas pelo fluxo de radiação
cósmica. Por isso, a anomalia é monitorada por agências espaciais como a ESA e
a NASA, e mais recentemente pelo Brasil, que lançou ao espaço o nanossatélite
NanosatC-BR2 com esta missão.
É o que explicou à Agência Brasil o doutor em
Física, pesquisador do Observatório Nacional, Marcel Nogueira.
”Por que as agências espaciais tem interesse na
anomalia? Porque como essa região tem um campo mais enfraquecido, as partículas
do vento solar adentram nessa região com mais facilidade, o fluxo de partículas
carregadas que passam por aquela região é muito mais intenso”, explica
Nogueira. “Isso faz com que os satélites quando passam por essa região, eles
tenham que, por vezes, ficar em stand by, desligar momentaneamente alguns
componentes para evitar a perda do satélite, de algum equipamento que venha a
queimar.
Porque a radiação, principalmente elétrons, nessa
região é muito forte. Então é de interesse das agências espaciais monitorarem
constantemente a evolução desta anomalia, principalmente nesta faixa central”,
complementa. Imagine um dia sem internet, celular, GPS ou meios de comunicação?
Se o fenômeno afeta os satélites que são
responsáveis por sistemas de comunicação e geoposicionamento, então ele pode
afetar a nossa vida tão tecnológica. “Se gente estuda as tempestades também,
temos condições de melhorar o nosso sistema de distribuição de energia elétrica
e protegendo, evitando esses blecautes.
Porque na vida cotidiana que a gente tem hoje em
dia, tão dependente da tecnologia, qualquer tipo de apagão no sistema elétrico,
de qualquer país, gera prejuízo de milhões ou até bilhões de dólares. É algo
muito importante para nossa vida tecnológica hoje em dia.”, diz o pesquisador.
No Brasil, além do nanossatélite lançado ao espaço em uma parceria com a
agência espacial da Rússia, também há dois observatórios magnéticos que, entre
outras missões, estão focados em responder questionamentos sobre esta anomalia:
Vassouras, no Rio de Janeiro, e Tatuoca, na região amazônica.
Ambos fazem parte da Rede Global de Observatórios
Magnéticos, o Intermagnet. A falta de conclusões desperta curiosidade sobre a
Anomalia do Atlântico Sul. Por isso é que ela acaba sendo popularmente
associada a eventos como os já registrados no Triângulo das Bermudas. Mas,
Marcel prefere dizer que o fenômeno é muito mais um desafio tecnológico e que
não há conclusões que apontem para os riscos do fluxo das radiações cósmicas na
vida humana.
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Fonte: MetSul - Meteorologia