A vereadora de Campo Erê SC, Rozane Bertoncello Moreira,
teve na justiça o direito de resposta, por ter seu nome mencionado em
veiculações na emissora de rádio local.
Segundo a sentença proferida pelo juiz de Direito da Comarca
Valter Domingos de Andrade Junior, a emissora teve que veicular em sua programação
o direito de resposta, por sete dias, na proporção de nove chamadas diárias.
Antecipadamente ao recurso a emissora teve que divulgar
metade do tempo que constou na sentença em razão do deferimento de medida
liminar.
Caso a emissora não cumprisse a decisão, a multa diária
seria de R$ 3.000,00 os, limitada a R$ 500.000,00.
A ré foi condenada ao pagamento das despesas e de honorários
advocatícios que foram estabelecidas em R$ 2.500,00.
Entenda:
A emissora, no espaço publicitário do município de Campo Erê,
divulgou por vários dias informações que acusava a vereadora de ter cometidos
falhas na gestão da secretaria de educação do município na gestão anterior.
Dizia a
publicação:
Infelizmente
Campo Erê ainda sofre as consequências de equívocos do passado, como é o caso
da Secretaria de Educação, onde a ex-secretária vereadora Rozane Bortoncelo
Moreira cometeu falhas que culminaram com o bloqueio do PAA, Plano de Ações
Articuladas. Graças a isso, várias obras deixaram de ser realizadas
representando prejuízo de cerca de dois milhões de reais para Campo Erê, na
medida em que os equívocos da então secretária impediram o Município de receber
três ônibus e uma escola, situação que a atual administração tenta agora
regularizar ainda com suas diversas tratativas em Brasília. Deve-se salientar
ainda, com relação às irregularidades na educação praticadas por Rozane
Bortoncelo Moreira, em outubro de 2018 a então secretária Paula Tonial e o
prefeito em exercício Marcos Mariani formalizaram e relataram as
irregularidades para a Câmara de Vereadores do Município de Campo Erê. Esta
situação, além da questão financeira, representou prejuízo incalculável,
inclusive comprometendo o futuro da educação em Campo Erê. É Campo Erê, mesmo
assim, melhor a cada dia. Orgulho de viver aqui.
Segundo consta no processo, o modo de expressão da notícia, as
ênfases no nome da autora, tudo aliado às circunstâncias objetivas e subjetivas
subjacentes aos fatos (especialmente as pessoas envolvidas), deixam evidente se
tratar de um ataque político, realizado com mera intenção difamatória.
Não há nada na inserção, absolutamente nada, que diga respeito à
publicidade institucional.
Assim, reconhecida a má-fé na veiculação da notícia, o pedido
deve ser acolhido para determinar o direito de resposta, pois o tempo concedido
extrajudicialmente para resposta é muito inferior ao das matérias.
“De outro lado, a existência do contrato administrativo trazido
no evento n. 18-4 em nada infirma a possibilidade de condenação da parte ré. O
absurdo seria se a ré pudesse opor a terceiros, que nenhuma relação jurídica
possuem com ela ou com o Município de Campo Erê, os efeitos principais deste
negócio jurídico, em manifesta ofensa à relatividade dos contratos. Se a autora
alienou parte de sua grade o fez por vontade própria e - presume-se - com a plena
consciência dos riscos ligados à operação. Deve, então, arcar com atos de má-fé
praticados pelos adquirentes destes espaços, sem prejuízo de eventual direito
de regresso”.
Já os gestores municipais envolvidos couberam a justiça
encaminhar o processo ao Ministério Público SC, para apuração de eventual ato
de improbidade administrativa.
A emissora recorreu da sentença.
Confira na integra:
Petição Cível Nº 5000062-09.2019.8.24.0013/SC
REQUERENTE: ROZANE BORTONCELLO MOREIRA
REQUERIDO: RÁDIO ATALAIA LTDA
SENTENÇA
ROZANE BORTONCELLO MOREIRA promoveu ação em relação à RÁDIO
ATALAIA LTDA, na qual se insurge contra diversas matérias veículadas pela ré -
que lhe teriam imputado uma falsa desídia no exercício de cargo público - e o
pouco tempo de resposta que lhe foi concedido. Pede, com fundamento na Lei n.
13.188/2015, o direito de resposta em tempo proporcional ao agravo.
Citado, o réu apresentou resposta, na qual sustentou, primeiro,
e em observância do art. 6º da Lei n. 13.188/2015, ter divulgado a resposta da
autora em 20.3.2019.
Depois, na contestação (Lei n. 13.188/2015, art. 6º, II),
suscitou a decadência e argumentou novamente ter concedido o direito de
resposta. Disse, ainda, que as matérias foram públicadas por ordem do Município
de Campo Erê, em faixas de horário reservadas ao ente público em razão do
contrato administrativo n. 16/2019, oriundo da licitação n. 16/20169, cujo
objeto é a veículação de avisos e recados de utilidade pública, e, assim,
defende não possuir qualquer ingerência sobre o conteúdo que vai ao ar.
Argumentou que não poderia veícular a resposta nestes espaços em razão de
estarem comprometidos contratualmente. Requereu a improcedência dos pedidos e,
subsidiariamente, a não condenação em despesas e honorários advocatícios por ausência
de previsão na Lei n. 13.188/2015.
É o relatório. Decido:
Liberdade de expressão é o direito individual de comunicar
ideias, opiniões e informações a qualquer um disposto a ouvi-las. Pode ser
defendido por uma perspectiva libertária, baseada no direito natural e
inalienável do indivíduo de externar os próprios pensamentos, sem ameaça de
coerção do Estado, ou da perspectiva de sua utilidade social, que vê no livre
debate de ideias o meio mais eficiente de fomentar o progresso.
A utilidade social da liberdade de expressão se evidencia em
maior intensidade no âmbito da fiscalização das ações do Estado. Qualquer
agente público, por ter em suas mãos uma parcela, ainda que mínima, do poder de
império estatal, encontra-se numa posição sujeita a amplo escrutínio e
julgamentos dos demais cidadãos. Isso ocorre porque o controle e avaliação de
suas ações pelos respectivos destinatários é uma prerrogativa de cujo
reconhecimento depende a própria legitimidade de seu poder de autoridade. A
plena liberdade de opinião, crítica e informação, por sua vez, é tão essencial
ao exercício pelo público dessa prerrogativa, que o respeito a estes direitos
pode ser alçado ao mais alto nível de importância.
Uma adequada tutela da liberdade de expressão, contudo, é
impossível sem substancial redução do direito à privacidade e à honra do agente
público. É frontalmente contrária às conclusões acima a ideia de garantir-lhe
uma esfera privada igual à do particular: a exigência de que se autorize ampla
divulgação de fatos e opiniões relacionados a autoridades seria impossível
frente a uma defesa tão intensa de sua privacidade e honra. A transparência
exigida de suas condutas também.
Essa restrição de direitos, no entanto, justifica-se, de uma
perspectiva coletiva, porque as vantagens públicas da livre veiculação de
críticas, ideias e notícias, no que toca aos detentores do poder estatal, são
infinitamente maiores do que eventual dano à sua honra individual. Da
perspectiva do agente, por sua vez, são legítimas porque nada representam além
de um ônus intrínseco à sua livre opção pela vida pública.
É por isso que lei alguma pode impedir críticas a um agente
público, ainda que deselegantes ou injustas, ou que informações verdadeiras
sobre sua pessoa sejam levadas a conhecimento público. Deve-se reconhecer que a
liberdade de expressão, nesses casos, se traduz concretamente num privilégio do
cidadão comum, uma “imunidade” civil e penal na transmissão de críticas e
notícias, que é tanto mais intensa quanto maior for a ligação da declaração com
o exercício da função pública.
Até as declarações relativas à vida privada das autoridades são
dignas de proteção. O adultério, por exemplo, é um fato de interesse privado
que ganha relevância pública quando envolve autoridades cuja escolha é
influenciada por aspectos pessoais, como, p. ex., um governador ou o presidente
da república. De extrema importância, aliás, que os eleitores discutam o
caráter de titulares ou candidatos a cargos públicos, principalmente eletivos:
“a importância ao Estado e à sociedade destas discussões são tão
vastas, e as vantagens derivadas tão grandes, que elas mais do que
contrabalançam a inconveniências de pessoas privadas cuja conduta possa ter
sido envolvida, e a ocasional ofensa à reputação dos indivíduos deve se curvar
ao bem-estar público, apesar de que às vezes essa lesão possa ser grande. O
benefício público decorrente da publicidade é tão grande, e a chance de ofensa
à honra privada tão pequena, que discussões desse tipo devem ser
privilegiadas.”
(ROUSSEAU ANGELUS BURCH).
Por outro lado, não apenas as declarações objetivamente
verdadeiras são protegidas pela liberdade de expressão. A proteção de
declarações equivocadas realizadas de boa-fé é igualmente essencial. Entender o
contrário tornaria letra morta o art. 220, caput, §1º e 2º, da Constituição. A
autocensura fomentada por leis que exigem do declarante certeza absoluta acerca
de todos os pressupostos de fato de suas declarações nada mais é que uma forma
mitigada de censura institucional, que instrumentaliza o poder judiciário na
promoção de interesses que, à luz do daqueles dispositivos constitucionais, não
receberiam diretamente qualquer tutela jurídica.
Daí por que, considerando que a boa-fé é sempre presumida, só se
pode condenar alguém a indenizar uma autoridade - e isso vale igualmente para
medidas coercitivas que naturalmente atingem os veículos de comunicação, tal
como como o direito de resposta aqui postulado - nos casos em que demonstrado
claramente, além da vontade de ofender, que o noticiante tem conhecimento da falsidade
das afirmações que divulga ou que, no mínimo, age com manifesta negligência no
descobrimento da verdade (culpa lata dolus aequiparatur). Fora desses estreitos
limites, a transmissão de qualquer informação, ainda que depois comprovada
falsa, é lícita e, portanto, não deve se sujeitar à intervenção do Estado.
Permitir, aliás, que agentes públicos possam processar
indiscriminadamente veículos de comunicação sob grave ameaça de comprometimento
de suas grades de horários consistiria expediente de intimadação e, por outras
vias, uma forma mitigada de censura. O direito de resposta do agente público,
portanto, deve ter seu âmbito restrito às hipóteses de ato doloso ou
negligência grave.
As críticas, por sua vez, desde que guardem um vínculo mínimo
com o exercício da função, gozam de imunidade absoluta. "Quem aceita ter
uma vida pública, fica exposto a todo o tipo de crítica e tem que conviver com
isso com serenidade e grandeza." (LUÍS ROBERTO BARROSO)
No caso concreto, as veículações imputavam à autora desídia no
exercício do cargo de Secretária de Administração do Município de Campo Erê,
críticas específicas ao acompanhamento de determinado programa governamental.
Criticas duras à atuação de agentes políticos, sob as premissas
acima, não dão direito à indenização nem garantem direito de resposta.
O caso, contudo, tem uma particularidade importante: a ré
informou o juízo de que as notícias foram publicadas por ordem do próprio
Município de Campo Erê, com o objetivo de serem veículadas em horários
alienados ao ente público para publicidade institucional, tudo conforme o
contrato administrativo n. 16/2019 (e. 18-4).
É um órgão do Estado, portanto, o responsável pelas publicações,
não um particular utilizando seus direitos fundamentais. É situação que
excepciona as restrições acima indicadas.
De outro lado, a má-fé na inserção é nítida. Imputa-se à autora
uma acusação de desídia sem qualquer concretude em inequívoco tom de propaganda
eleitoral:
Infelizmente Campo Erê ainda sofre as consequências de equívocos
do passado, como é o caso da Secretaria de Educação, onde a ex-secretária
vereadora Rozane Bortoncelo Moreira cometeu falhas que culminaram com o
bloqueio do PAA, Plano de Ações Articuladas. Graças a isso, várias obras
deixaram de ser realizadas representando prejuízo de cerca de dois milhões de
reais para Campo Erê, na medida em que os equívocos da então secretária
impediram o Município de receber três ônibus e uma escola, situação que a atual
administração tenta agora regularizar ainda com suas diversas tratativas em
Brasília. Deve-se salientar ainda, com relação às irregularidades na educação
praticadas por Rozane Bortoncelo Moreira, em outubro de 2018 a então secretária
Paula Tonial e o prefeito em exercício Marcos Mariani formalizaram e relataram
as irregularidades para a Câmara de Vereadores do Município de Campo Erê. Esta
situação, além da questão financeira, representou prejuízo incalculável,
inclusive comprometendo o futuro da educação em Campo Erê. É Campo Erê, mesmo
assim, melhor a cada dia. Orgulho de viver aqui.
O modo de expressão da
notícia, as ênfases no nome da autora, tudo aliado às circunstâncias objetivas
e subjetivas subjacentes aos fatos (especialmente as pessoas envolvidas),
deixam evidente se tratar de um ataque político, realizado com mera intenção
difamatória.
Não há nada na inserção, absolutamente nada, que diga respeito à
publicidade institucional.
Assim, reconhecida a má-fé na veiculação da notícia, o pedido
deve ser acolhido para determinar o direito de resposta, pois o tempo concedido
extrajudicialmente para resposta é muito inferior ao das matérias.
De outro lado, a existência do contrato administrativo trazido
no evento n. 18-4 em nada infirma a possibilidade de condenação da parte ré. O
absurdo seria se a ré pudesse opor a terceiros, que nenhuma relação jurídica
possuem com ela ou com o Município de Campo Erê, os efeitos principais deste
negócio jurídico, em manifesta ofensa à relatividade dos contratos. Se a autora
alienou parte de sua grade o fez por vontade própria e - presume-se - com a
plena consciência dos riscos ligados à operação. Deve, então, arcar com atos de
má-fé praticados pelos adquirentes destes espaços, sem prejuízo de eventual
direito de regresso.
Também não há decadência. O direito de resposta é exercido
extrajudicialmente (Lei n. 13.188/2015, art. 3º) e, apenas se negado, é objeto
de judicialização (art. 5º). Assim, a própria ré admite que o agravo se iniciou
em 16.3.2019. De outro lado, a notificação extrajudicial foi realizada com
certeza até o 20.3.2019 (v. email do e. 1-3, p. 7) e, portanto, dentro do prazo
decadencial.
Por fim, a ré deverá veicular a resposta indicada na petição
inicial por sete dias, na proporção de nove chamadas diárias, uma vez que a
periodicidade indicada na inicial não foi objeto de controvérsia. Não deve ser
descontado o tempo já concedido pois "A resposta ou retificação cuja
divulgação, publicação ou transmissão não obedeça ao disposto nesta Lei é
considerada inexistente." (Lei n. 13.188/2015, art. 4º, §3º)
Diante de tudo isso, com fundamento no art. 487, I, do CPC,
julgo procedente o pedido formulado na inicial para determinar à ré que veicule
a resposta da autora contida na inicial por 7 dias seguidos, em nove chamadas
diárias, tudo nos mesmos horários em que veículadas as chamadas originais, em
até 10 dias a contar do trânsito em julgado, independentemente de nova
manifestação judicial.
Considerando a natural necessidade de que o direito de resposta
seja exercitado tempestivamente, sob pena de as veiculações da ré se
consolidariam na consciência coletiva como verdadeiras, concedo tutela
provisória de urgência do art. 7º, parte final, da Lei n. 13.188/2015 para
determinar que, salvo manifestação em contrário da autora, metade das respostas
sejam veiculadas independentemente do trânsito em julgado, em até 20 dias
contados da intimação desta decisão, prazo que concedo para que a ré
eventualmente postule o efeito suspensivo a que alude o art. 10 da Lei n.
13.188/2015.
Arbitro multa de R$ 3.000,00 ao dia em caso de descumprimento
dos provimentos aqui proferidos, limitada a R$ 500.000,00.
Condeno a ré ao pagamento das despesas e de honorários
advocatícios que estabeleço em R$ 2.500,00. Registro que, na omissão da Lei n.
13.188/20155, devem ser aplicadas as regras relativas a honorários previstas no
Código de Processo Civil.
No mais, considerando a notícia de que o Município de Campo Erê
veículou, em espaço adquirido para publicidade institucional, ataques políticos
contra aparentes desafetos do Prefeito Municipal, oficie-se ao Ministério
Público, com cópia integral destes autos, para apuração de eventual crime do
art. 1º, II, do Decreto-Lei n. 201/1967 e ato de improbidade administrativa.
Registro, ainda, que a inserção trazida aos autos (e. 12) aparentemente traz
promoção pessoal de autoridades, em descumprimento do art. 37, §1º, da
Constituição, ao mencionar nominalmente o Secretário Ademar Alberton após
listar diversos projetos de sua pasta e caracterizá-los como "muito bem
conduzido[s]", além de citar outros agentes públicos.
Transitada em julgado, caso nada mais seja requerido, arquivem-se os autos.
Fonte: CampoErê.Com/Potal TJ-SC